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Política

Ailton Krenak é eleito imortal da Academia Brasileira de Letras

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Intelectual indígena ocupa a cadeira número 5, que pertencia ao historiador José Murilo de Carvalho, morto em agosto de 2023. Numa votação histórica, a ABL elegeu o primeiro indígena

Em uma votação histórica, a Academia Brasileira de Letras elegeu nesta quinta-feira (5) o primeiro indígena da casa. O ambientalista e filósofo Ailton Krenak vai ocupar a cadeira de número cinco.

Um poeta e filósofo da floresta reconhecido como um dos maiores intelectuais do país. Indígena da etnia Krenak. "A palavra Krenak, o nome quer dizer o quê? ", questionou Pedro Bial. "Cabeça terra, no sentido que nós somos terra", respondeu o intelectual.

Ailton Alves Lacerda Krenak nasceu em Itabirinha, em Minas Gerais, na região do Vale do Rio Doce. Saiu dali ainda adolescente para morar no Paraná, onde se tornou produtor gráfico e jornalista. Foi um jovem militante. Nos anos 1970, participou da criação da União das Nações Indígenas, primeiro movimento de expressão nacional, que enfrentou resistência da ditadura militar.

"E foi representando esse conselho de tribos que eu fiz uma intervenção na Constituinte de 88, sinalizando que não somos povos que estamos aqui temporariamente para depois virar branco. Nós queremos ser respeitados", disse ele.

Ailton Krenak teve papel decisivo na Assembleia Constituinte, e protagonizou um dos momentos mais emocionantes, quando subiu à tribuna para defender o direito à terra e o respeito às populações indígenas.

"Os senhores não poderão ficar omissos, os senhores não terão como ficar alheios a mais essa agressão, movida pelo poder econômico, pela ganância, pela ignorância do que significa ser um povo indígena. Um povo que habita casas cobertas de palha, que dorme em esteiras no chão não deve ser identificado de jeito nenhum como povo inimigo dos interesses do Brasil, inimigo dos interesses da nação e que coloca em risco qualquer desenvolvimento", disse na ocasião.

Ailton Krenak é criador de um centro de estudos indígenas e com frequência é convidado para dar palestras dentro e fora do Brasil. Recebeu os títulos de doutor honoris causa das universidades de Brasília e de Juiz de Fora.

1º indígena na Academia Brasileira de Letras, Krenak não tem hábito de escrever; entenda

Em busca de peças da história de seu povo, Krenak esteve na Rússia.

"Foi forte pra mim o impacto de chegar lá no museu e ver um baú de coisas levadas aqui do Brasil e que ficaram durante muito tempo sem trânsito entre o Brasil, sem a gente saber o que tinha lá. Mas eu acho que coisa mais importante que a gente localizou naquela visita foram as anotações do viajante sobre a língua krenak", contou no documentário Ailton Krenak e o Sonho da Pedra.

Recentemente, voltou a morar na aldeia Krenak, em Minas Gerais. Foi ali, às margens do Rio Doce, poluído pelo rompimento da barragem da mineradora Samarco, em 2015, que ele gravou essa entrevista para o programa Conversa com Bial:

"Para mim, a água é uma entidade, não é um recurso. Aí quando ouço falar que a água é um recurso natural, eu fico pensando: ainda não entenderam nada. Ele tem uma função maravilhosa que dispensa nosso senso de utilidade. Mesmo que a gente não use nada do corpo da água, ele está fazendo um serviço essencial para o planeta", afirmou na ocasião.

Defensor incansável do meio ambiente e crítico da sociedade de consumo, costuma lotar auditórios e feiras onde lançou algumas de suas obras de maior sucesso. Livros como "O amanhã não está à venda" e "Ideias para adiar o fim do mundo".

"É importante que esse pensamento dos indígenas possa estar presente no nosso pensamento plural. Pensar o país com diversidade cultural", disse Krenak durante feira de livros em Santa Catarina em junho de 2023.

Em 2020, Krenak conquistou o prêmio Juca Pato de intelectual do ano concedido pela União Brasileira dos Escritores. Em outubro de 2023, ele vai lançar o livro "Um rio um pássaro", que narra a sua jornada por terras indígenas nos anos de 1980 e 1990. Ele também está presente na internet, onde entrevista pensadores deitado em uma rede.

Suas obras já foram traduzidas em 13 países, mas Krenak, por incrível que pareça, não tem o hábito de escrever. A narrativa de Ailton Krenak segue a tradição indígena da oralidade. Os indígenas costumam transmitir o conhecimento utilizando a voz, a palavra não escrita. E todas as obras de Krenak, segundo sua editora, são transcrições de entrevistas, conversas e discursos feitos por ele. A Academia Brasileira de Letras reconhece o autor pela força da sua fala.

"A linguagem dele é uma beleza e a academia está muito feliz de reconhecer, valorizar a cultura indígena da qual o Krenak é um representante importantíssimo. Então isso para a academia é a reafirmação da nossa vontade de termos a maior representatividade possível da cultura brasileira aqui dentro", disse Merval Pereira, presidente da ABL.

Ailton Krenak é o primeiro indígena eleito imortal da ABL

Jornal Nacional/Reprodução

Primeiro indígena a ingressar na Academia Brasileira de Letras, Ailton Krenak foi eleito com os votos de 23 dos 39 acadêmicos. Krenak será o sétimo ocupante da cadeira número cinco, que já pertenceu a Rachel de Queiróz, e ingressa no lugar de outro mineiro, o historiador José Murilo de Carvalho, morto em agosto de 2023.

"Há tantos anos os povos originários estão no exílio da cultura que a eleição do Ailton hoje traz para dentro da cultura nossa a cultura dele. Isso é uma coisa extremamente importante e é isso que faz o nós, e esse nós que é o Brasil", disse a jornalista e escritora Rosiska Darcy.

Depois da eleição, Ailton Krenak foi homenageado em uma recepção na casa do artista plástico e cenógrafo Luiz Zerbini.

"Eu completei 70 anos na semana passada. A maioria dos outros autores indígenas devem chegar aos 60, 50, 40. E tem uma constelação de meninos e meninas escrevendo e publicando agora. Com esse espécie de prisma que se abre para que o pensamento indígena, amplo, não do Ailton, coletivo, alcance o patamar que tem o direito de alcançar", disse Krenak.

G1 nacional

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